domingo, 2 de dezembro de 2007

Opinião

BRASIL, COLISEU PRA UM EVENTO MUNDIAL
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Paulo Afrânio Silva de Lima
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Quem assistiu ao filme Gladiador, vai lembrar daquela multidão submetida pela política do "pão e circo" que lotava as arenas, e em especial o monumental Coliseu Romano, que chegava a abrigar até 100 mil pessoas (número considerável pra época). A política do pão e circo foi utilizada na Roma antiga e continua muito atual hoje em dia, o que demonstra mudarem-se apenas os lugares e os povos, mas não o modo que age o ser humano. Esta política circense vale pros nossos dias: deixa o povo abobado, extasiado e anestesiado, sem reclamar ou protestar em relação às injustiças sofridas. Estaremos vivendo mais um momento circense da Roma atual: Copa 2014
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A Copa trará investimentos em obras, pagamento dos direitos de transmissão dos jogos, eventos preparatórios, consultorias internacionais, gastos com o Comitê Organizador, valorização dos terrenos em que serão montados os equipamentos, infra-estrutura necessária nos locais de competição, tecnologia, melhoria nos transportes urbanos, na segurança, empregos diretos e indiretos, etc.
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Mas estamos certos de que temos condições pra realizarmos uma copa do mundo sem o desperdício de recursos públicos, igual com o que aconteceu com os jogos Pan-Americanos, que passaram mais de 600% do valor fixado no orçamento divulgado em 2002 onde foram gerados gastos que giraram em torno de R$ 2 bilhões? Nosso povo gozará dos benefícios tragos por essa Copa? Será que centenas de municípios que não fazem parte daquelas 12 grandes cidades que sediarão os jogos, sentirão algum efeito em suas economias, por exemplo - empregos, infra-estrutura, transporte urbano? Visto que o Brasil abriga 5.564 municípios.
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Somos um país de dimensão continental, será que os torcedores, nos intervalos de cada jogo, irão aproveitar pra conhecer outras localidades do País igual nos países europeus, como França, Alemanha, Espanha e outros de dimensões similares em que foi sediada copa do mundo?
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Quem não lembra do PAC (Programa de aceleração de crescimento) que havia quadrilhas de empresas, políticos e indivíduos na fila para abocanhar grande parte do dinheiro do povo, (e ainda há)! Investir-se-á muito, pra realização dessa Copa e mesmo que haja retorno com a realização desse evento, quem de fato vai sair lucrando? Com certeza, muitos tubarões já andam pensando como supervalorizar obras. CBF (Confederação Brasileira de Futebol), Governo (federal, estadual, municipal), Empresários, FIFA (Fédération Internationale de Football Association), etc., já sabem como lucrar com mais essa alegria do povo.
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A realidade que essa Copa encontrará será: hospitais falidos, segurança corrompida e um povo que recebe um salário mínimo que mal dá pra comprar uma cesta básica, quanto mais investir na educação e num lazer consciente. Você poderá argumentar: “Mas o Pan 2007, no Rio de Janeiro, melhorou a segurança pública, logo se com o Pan foi assim, com a copa será assado”. Ninguém veio dizer que a segurança no Rio só melhorou enquanto durou o evento.
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Depois da copa continuaremos ganhando o mesmo salário mínimo e nossa fome de pão e paz não será saciada. O dinheiro dos investidores retornará pra eles mesmos; o dinheiro público cobrirá rombos criados pelo superfaturamento gerado pelos mais diversos investimentos. E o povo do pão e do circo de novo ficará com as migalhas do bolo.
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Por que não investir na saúde pública? Em Brasília, por exemplo, faltam seringas, sondas enteral, exames clínicos, leitos para os pacientes, medicamentos, funcionários enfim, mas tudo fica bem no país do futebol. Fingimos que tudo tá bem quando há festas e comemorações pra ocultar a nossa fome. Investir na educação, geração de empregos seria um passo dado na criação de uma segurança tão desejada.
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Ao término deste artigo deixo as mesmas palavras, emocionadas, do nosso queridíssimo presidente Lula ao realizar o discurso do anúncio da Copa:
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– Estamos assumindo a responsabilidade como nação de provar ao mundo que temos uma economia crescente e estável. Temos uma economia estabilizada. Muitos problemas, sim, mas com homens determinados a resolvê-los.
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Somos patriotas, que venha a Copa 2014! Que venha a política pão e circo, vamos adorar! Pois, o Brasil, servirá de Coliseu pra esse grande evento mundial.
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*Paulo Afrânio Silva de Lima é ex-seminarista. Filósofo pelo Seminário Arquidiocesano da Paraíba Imaculada Conceição (SAPIC) e teólogo pela Faculdade São Bento do Rio de Janeiro (FSBRJ). Trabalhou com a Pastoral da Criança, Comunidades Eclesiais de Base e Missões. Atualmente reside em Brasília onde administra o blog Voz Inquieta (http://vozinquieta.blogspot.com/).

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